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Neguei tanto que não lembro mais

Há um ano atrás, no último ano do ensino médio, eu fiquei durante um tempo com um menino. Fui eu quem deixei claro que não tinha muitas intenções, que deveríamos deixar rolar e tudo mais. Me emocionei, sabia que ele não estava na mesma que eu, e resolvi terminar um dia, na escola mesmo, por impulso. Achei que estava tomando uma decisão madura e consciente, e combinei que não haveria climão. Mas houve muito climão: eu não ficava mais confortável perto dele de tal forma que perdia minha noção de espaço e todas as minhas energias sociais. Passei a ter medo de frequentar os mesmos ambientes que ele. Meses atrás, no metrô, achei que ele estava do meu lado quando vi um menino muito parecido com ele e entrei em pânico com o celular na mão. Não lembrava do que estava fazendo e rodei todos os aplicativos sem rumo. Foi um alívio quando descobri.

Mas esse desabafo não é sobre isso. É sobre ter superado há muito tempo, de verdade, mas não lembrar o que aconteceu porque eu neguei, pra mim e pra todos os meus amigos, o que eu estava sentindo, o que me motivou a terminar e o que estava realmente acontecendo. Eu não queria sair como quem se emocionou e teve que meter o pé pra poder superar. Eu tinha um ego muito ferido.

Pois bem. Ontem tive uma noite maravilhosa com dois meninos que conheci. Fui para casa com eles. Num momento, eles estavam falando sobre suas experiências traumáticas com ex’s e perguntaram pelas minhas. É claro que pensei nele na hora e, já que tava todo mundo no mesmo barco, resolvi contar. Só que eu não lembrava a verdadeira ordem dos fatos, então eu soltei uma versão tão genérica, mas tão genérica, que soou como mentira. Apesar de ter sido uma boa noite, eu passei o dia seguinte remoendo como devo ter passado como mentiroso, e como eu era incapaz de contar meus traumas porque simplesmente não resolvi eles quando devia na tentativa de proteger meu ego.

É uma merda ter que voltar para esse episódio da minha vida depois de tanto tempo. Curioso é que eu costumava dizer que realmente não gostava de pensar muito sobre minhas tristezas porque é assim que elas passam e sempre funcionou muito bem. Na verdade, todo o papo de que “você precisa colocar para fora”, “viva sua tristeza”, “permita-se ficar triste”, para mim, não passava de um clichê. Eu estava errado. Agora, me preocupo em tentar lembrar com quantas angústias já fiz isso durante minha vida e em como as consequências podem estar escondidas até que venham a tona, como veio ontem.

Escrevo aqui porque meu ego ainda não permite conversar com alguém próximo sobre. Mas acho que fiz bons avanços: passei o dia reconstruindo as lembranças e os fatos pra, quem sabe, na próxima vez que alguém perguntar, poder falar a verdade e ser honesto comigo acima de tudo.
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