Eu estou cansada
A turbulência teve início por volta de outubro do ano retrasado, devido a um mero estresse por estar insatisfeita com o meu emprego (jovem aprendiz) e meu ambiente de trabalho; porém isso desencadeou uma série de transtornos somados a outros acontecimentos. Minha mente passou a ficar muito sobrecarregada, ao nível de me sentir desnorteada enquanto seguia a rotina. Era como se eu estivesse borbulhando por dentro. Foi agonizante conviver com isso, e a minha capacidade de raciocinar também acabou indo por água abaixo. Por causa disso eu comecei a sentir medo no trabalho de ser chamada para ajudar em outro setor ou receber instruções para exercer algo novo. No início do ano passado eu quase pedi demissão por não estar conseguindo ter tempo para descansar, ainda mais porque eu estava no terceirão. Mas como sou uma grande vidente, decidi continuar, pois eu já tinha previsto que poderia ficar incapacitada de estudar para o Enem, deixando-me com a opção de pagar uma faculdade particular com o meu salário. E pois é, acabei conseguindo uma vaga numa faculdade de renome recentemente e tenho garantida a quantia necessária para cobrir todas as mensalidades. Ótimo! Só consegui respirar com o início da quarentena, afinal o meu contrato de trabalho foi suspenso e eu também não precisava mais comparecer à escola. Comparada àquela época, hoje eu estou bem melhor. Porém o meu novo impasse passou a ser a convivência familiar aqui dentro de casa. Eu não tenho privacidade, e preciso de silêncio para me manter sã. Eu estou precisando acordar às quatro da manhã — sendo que a pouco tempo atrás era às duas — para conseguir realizar alguns dos meus afazeres em paz, porque à tarde eu fico agoniada, suando com facilidade e andando pela casa toda sem conseguir ficar quieta por muito tempo num canto. Muitas vezes acabo saindo para algum lugar apenas para respirar um pouco. Talvez eu esteja até começando a desenvolver TOC acerca de algumas coisas. Sinceramente eu não consigo me sentir triste, alegre ou raiva com intensidade; também estou tendo dificuldades para me preocupar com uma coisa de cada vez e para organizar as minhas ideias. Tenho de confessar que eu optaria por me sentir triste que ser sujeita a isso se pudesse, porque a tristeza pode ser poética para aqueles que amam escrever, e minha imaginação não está sendo repleta por um céu cinzento ou um clima capaz de me deixar em um estado de transe — na verdade ela está sendo tomada por vendavais de ar quente, e eu estou sendo levada por eles. Por causa da ansiedade a prática da masturbação também está se tornando um pouco compulsiva, embora eu fosse bem moderada com isso antes da pandemia. Completei dezoito anos recentemente e em breve estarei cursando licenciatura em Letras. O ensino é à distancia. Irei aproveitar a flexibilidade de horários que o EAD proporciona para eu estudar de madrugada, e como sou uma pessoa noturna acredito que não terei muita dificuldade a respeito do horário. Eu sou uma autodidata de natureza e estarei cursando algo que gosto, então devo conseguir desenvolver um pouco de disciplina... porém graças ao meu estado atual eu também não duvido que acabarei não conseguindo me empenhar muito no início, e estou insegura por causa disso. Eu já pensei em apelar aos medicamentos para alcançar um pouco de disposição e concentração, mas também tenho medo de que os efeitos colaterais possam afetar a minha criatividade. Eu quero dar o meu máximo ao escrever... portanto estou sendo tomada de hesitação. E o que eu faço é tentar combater tudo isso através de coisas naturais: fazendo caminhadas, praticando exercícios físicos, melhorando a minha alimentação, evitando ficar muito tempo no celular... Mas parece que são apenas suspiros. As aulas do curso que é vinculado ao meu contrato de trabalho estão sendo on-line, nos dias de segunda e terça. Certamente estão sendo os dias da semana mais desconfortáveis, porque ultimamente eu venho tendo prazer em cumprir apenas os compromissos impostos por mim mesma, e estudar em casa logo à tarde é complicado. Em nenhum momento eu deixei de me amar, e continuo me esforçando para me manter de pé, mas não ficarei surpresa se eu for diagnosticada com depressão. Não possuo empolgação para realizar com eficiência os meus afazeres, muito menos concentração. Estou mais esquecida e distraída que o normal, e também estou perdendo a afeição que sinto por algumas pessoas. Como eu mesma disse, ainda permaneço de pé, porém estou genuinamente cansada.
